
Aos poucos, o livro foi ganhando espaço, abrindo caminho junto a tantos outros títulos e temas, promovendo importantes discussões em salas de aula que, bem conduzidas, produzem resultados excelentes. Em 2001, o livro foi atualizado, ganhou nova capa, diagramação e fôlego e já se vão 20 anos de estrada. É ainda um livro jovem que fala ao leitor jovem com algum conhecimento de causa. E, ao falar, é ouvido. Sim, pois como bem dizia Bartolomeu Campos de Queiroz: "ler é também escutar". No intenso diálogo que se estabelece entre autor, texto e leitor, há uma troca única e exclusiva.
Mas, voltando à carta da minha leitora (uma carta com caligrafia trêmula), ela assim começava: "Querida Sonia, graças ao seu livro deixei de fazer uma bobagem". Na sequência, ela me relatava seu amor adolescente, pleno de contradições - por ser maravilhoso, intenso e proibido - e da sua preocupação com a insistência de seu namorado em iniciar um relacionamento mais íntimo, já que o amor, o verdadeiro amor, tudo permite, tudo quer, tudo pode. Ela não deixou claro se a "bobagem" a que se referia era dar início à vida sexual ou se - já ultrapassada esta dúvida - era interromper uma gravidez não desejada.
Para quem não conhece o livro, ele fala sobre as inquietações de uma adolescente chamada Cely diante da gravidez de sua melhor amiga, também adolescente, Darlene. Permeando a narrativa com trechos do diário de Cely, descobrimos o que acontece em seu íntimo, o quanto de conflito e de incerteza a condição da amiga lhe provoca. Cely é a protagonista, mas quem está grávida é a outra, para que o leitor possa - em cumplicidade - partilhar medos e descobertas de Cely, que também se modifica, ainda que protegida por sua condição de espectadora: ela vive com Darlene uma história solidária e paralela cujas consequências não a atingem (não?).
Cumplicidade foi o que levou minha leitora, possivelmente sem ter outra opção, a recorrer a mim: "graças ao seu livro deixei de fazer uma bobagem... "Por um bom tempo, até poder lhe responder com minha humilde condição de mãe, mulher - em algum canto de mim ainda adolescente - eu me detive na palavra bobagem. Bobagem sexo? Bobagem filho? Bobagem aborto? E escrevi com o cuidado e a delicadeza de quem tem em mãos um pássaro ferido. Hoje, porém, ouço a voz do grande escritor, e me dou conta da força contida no que escrevemos/dizemos. E o que mais me impressiona na carta da menina é: "graças ao seu livro..."
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